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terça-feira, novembro 23, 2004


Jorge Palma no 'Jornal de Notícias'


Público dá-me segurança e garante a sobrevivência

Jorge Palma lançou "Norte", novo disco de originais composto no Porto Em conversa com o JN, cantor e compositor confessa-se "mais sóbrio e tranquilo" Popularidade em redor do artista continua a aumentar

Ei-lo de regresso. Apenas três anos e meio após o lançamento do seu álbum homónimo, Jorge Palma surge com um novo disco de originais. Intitula-se "Norte" e, realmente, foi quase todo concebido a Norte - no Porto e em Gaia.

O regresso é algo inesperado - não nos olvidemos que Palma esteve sem gravar originais durante mais de 12 anos antes do álbum anterior. Mas Jorge, sentado no sofá da sala da sua casa no centro de Lisboa, desmente que tenha sofrido pressões da editora "Às vezes perguntavam-me se já podiam ouvir alguma coisa nova e eu dizia para terem calma".

O novo trabalho "foi feito com muito rigor e nada foi deixado ao acaso". Contou com a preciosa colaboração de um leque de músicos e nele se ouvem canções escritas ao volante do automóvel, auto-estrada acima - rumo, claro, ao Norte "Um gajo quando está na auto-estrada vai concentrado. Deu-me para escrever orquestrações e outras ideias. Às vezes acontecia chegar a Gaia com coisas já praticamente escritas", afirma o condutor que escreve enquanto conduz mas que já não bebe antes, ou depois, de ir para o volante.

Não bebe? Não Jorge Palma largou o álcool. "Mas não quero dar muita importância a isso", murmura. "Agora sinto que ataco as coisas com muito mais vigor", confessa, admitindo que "a presença do álcool fez-se sentir sempre desde os 14 anos, mas isso não quer dizer que eu andasse sempre a cair de bêbado". E acrescenta: "Era só às vezes".

"Eu estava habituado a ter uma certa euforia e a preocupar-me menos com as coisas", prossegue, enquanto assevera que "foram muitos anos com essa bengala do copo de whisky e as cervejas". E, assim, Jorge Palma sente-se mais produtivo "O álcool ou outro tipo de aditivos podem estimular a imaginação e abrir as tais portas, mas isso só funciona durante um certo tempo", aponta. "Depois, às tantas, é só um vício e acabas por já deixar de ter acesso a um estímulo - torna-se um hábito, uma prisão e empata um bocado os movimentos".

Hoje o seu estilo de vida é "mais caseiro". Diz ele "Já não tenho o gozo de estar horas seguidas num bar ou numa discoteca. Estou lá um bocado, porreiro, estou com os meus amigos, mas passado um bocado venho para casa ler ou ouvir música para no dia seguinte estar fresquinho".

Jorge Palma nunca vendeu tanto como agora. O seu leque de admiradores disparou em todas as direcções sociais e não cessa de crescer. Ele tem consciência disso. E, claro, sente-se feliz "Ainda hoje, ali no café, um gajo que não tinha mais de 22 anos chegou ao pé de mim e disse: 'Posso cumprimenta-lo? Gosto muito do seu trabalho'. Isso acontece todos os dias".

Apesar de se considerar "um gajo que faz a sua vida independente, sem se preocupar muito com as opiniões dos outros", Palma, tem noção de que "houve muita gente que foi tomando consciência de que eu não era apenas aquele cromo com a guitarra às costas a tocar no metro". Não obstante admitir que já fez "muita merda em palco", o autor de "Só", orgulha-se dos casos de professores que utilizam as suas canções nas aulas, prova cabal de "um reconhecimento muito porreiro" e um sintoma de que "viram que não foi só andar aí a beber copos e a mandar bocas sou um gajo que pensa e que diz aquilo que pensa". "A minha grande segurança em termos de sobrevivência é o público", afirma, antes de rematar: "O que me interessa é fazer o que gosto, pá".

Antes ao piano do que na guitarra

Sejamos realistas "Norte" é um disco que vale bem o seu preço mas não é o melhor trabalho que gravou até hoje. É um bom disco. Não chega a ser excelente como alguns anteriores. "Se alguém cria expectativas exageradas, pá, o problema não é meu: eu não tenho o compromisso de ser o maior ou de fazer só coisas muito boas", afirma o músico, quando questionado sobre se terá, ou não, medo de decepcionar. Mas "Norte" tem pérolas preciosas: a faixa "Os demitidos", por exemplo, é provavelmente uma das melhores canções de toda a sua discografia. A letra é letal. "Pura e dura", assume Palma, ao mesmo tempo que diz ter bebido inspiração à célebre afirmação de Humberto Delgado ("Obviamente demito-o"): "Há uma série de mentalidades que deviam ser demitidas: gente que está agarrada ao tacho". "Acordar tarde", canção com poema de Al Berto, também merece elogios: "Não privamos muito mas havia uma cumplicidade implícita entre nós", recorda, referindo-se ao falecido poeta. Registe-se ainda a magnífica "Valsa de um homem carente", e "Passeio dos Prodígios", provando que Palma ganha um encanto maior quando envereda por registos baixos, apenas com piano e voz.
C.P.

:: Entrevista e artigo de Cristiano Pereira (Jornal de Notícias, 23/11/2004)
:: fotografia: César Santos




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